Adélia Prado certa vez escreveu:
“Erótica é a alma”.
Além de poética, a frase é redentora, pois alivia
o peso da sensualidade a qualquer custo,
a busca desenfreada
pela juventude perdida, a corrida pelos últimos
lançamentos da indústria cosmética.
E nos autoriza a cuidar mais da alma,
a viajar pro interior, a descobrir o que nos completa.
Pois se os olhos são as janelas da alma, de que
adianta levantar pálpebras se descortinam
um olho de súplica?
Erótica é a alma que se diverte, que se perdoa,
que ri de si mesma e faz as pazes com sua história.
Que usa a espontaneidade para ser sensual,
que se despe de preconceitos, intolerâncias,
desafetos.
Erótica é a alma que aceita a passagem do
tempo com leveza e conserva o bom humor
apesar dos vincos em torno dos olhos e o
código de barras acima dos lábios;
erótica é a alma que não esconde seus defeitos,
que não se culpa pela passagem do tempo.
Erótica é a alma que aceita as suas dores,
atravessa seu deserto e ama sem pudores.
Por que não adianta sex shop sem sex appeal;
bisturi por fora sem plástica por dentro;
lifting, botox, laser e preenchimento facial sem
cuidado com aquilo que pensa, processa e fala;
retoque de raiz sem reforma de pensamento;
striptease sem ousadia ou espontaneidade.
Querendo ou não, iremos todos envelhecer.
As pernas irão pesar, a coluna doer, o colesterol
aumentar. A imagem no espelho irá se alterar
gradativamente e perderemos estatura,
lábios e cabelos.
A boa notícia é que a alma pode permanecer com
o humor dos dez, o viço dos vinte e o
erotismo dos trinta anos.
O segredo não é reformar por fora.
É, acima de tudo, renovar a mobília interior:
tirar o pó, dar brilho, trocar o estofado, abrir as
janelas, arejar o ambiente. Porque o tempo,
-invariavelmente, irá corroer o exterior.
E, quando ocorrer, o alicerce precisa estar
forte para suportar.
Não tem problema cuidar do corpo.
É primordial ter saúde e faz bem dar um
agrado à auto estima. O perigo é ficar refém
do espelho, obcecado pelo bisturi, viciado
em esticar, reduzir, acrescentar, modelar –
até plástica intima andam fazendo!
Aprenda: bisturi nenhum vai dar conta do
buraco de uma alma negligenciada anos a fio.
Cuide do interior. Erotize a alma.
Enriqueça seu tempo com uma nova receita
culinária, boas conversas, um curso de canto
ou dança. Leia, medite, cultive um jardim.
Sinta o sol no rosto e por um instante não se
preocupe com o envelhecimento cutâneo.
Alongue-se, experimente o prazer que seu corpo
ainda pode lhe proporcionar. Não se ressinta
das novas dores, da pouca agilidade, dos novos
vincos. Descubra enfim que a alegria pode
rejuvenescer mais que o botox.
E não se esqueça: em vez de se concentrar no
lustre da maçã, trate de aproveitar o sabor que
ela ainda é capaz de proporcionar…
Fabíola Simões -
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